quarta-feira, 26 de março de 2008

Cadáver cristalizado

Dúvidas? Há sempre dúvidas. Duvidas? Não sabes que Rachi prendia as tranças ao tecto num espernear frenético ondulando espirais de um mundo labiríntico, quadrado. Percurso aguado por tintas de aguarela que descrevem no seu suave discorrer a vidência nacional do Alentejo de luz em ziguezague calcorreando por uma matéria informe ao bom estilo do pastoso pai de família. Coça o rabo, raspa a franja, esfrega as mãos – esta eu detesto – puxa para cima as calças amarelas, diz que não bebe, nem olha para as pessoas e o resto já não me lembro. Nós vemo-lo ali, como um livro sentado à mesa, com vergonha de ter comido demais. As ostras estavam podres, o vinho estava azedo, a fruta bolorenta...
Miscelânea de cores fétidas. Assim soava a nota musical que Dom Herrero gania ou trovava – como lhe queiram chamar –, certo é que a certa altura a flor murchava no casaco do ministro do governo de Salazar.
(Essa cena da coerência está-me aqui a moer a pipa agora). Voltando ao velho. Os braços já lhe pesavam, então quando queria frisar uma ideia mexia muito as sobrancelhas e anunciou o seu desafio: equilibrar uma estrela cadente na ponta do nariz, subindo um arco-íris.
– Quem o conseguir, ficará com o ouro.
– Ou então ficará com um valente Medo do bigode encharcado em vinho previamente quitado em água-de-colónia trinada de incertezas e desambiguações totalmente irrelevantes. Talvez um pouco menos que correr à neve. O ar ali à volta cheira a bola de Berlim.
Há Burdas espalhadas pelo chão, rasgadas em silêncio. Rachi pegou nos netos, coçou a orelha e pediu-lhes que arrumassem as coisas. Disse estas últimas palavras com brandura, soprando-as do seu buraco.
Chegara o dia feito da noite. O feto a seguir à noite cristalizado numa alucinação bestial, dançando em círculos, falando com os pássaros numa cacofonia muda. Vi então uma cara, anunciava algo que pôs toda a gente a dormir.

B, F, T, V.

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