domingo, 30 de março de 2008

quarta-feira, 26 de março de 2008







Deixa-me rir antes que me esqueça.





Cadáver cristalizado

Dúvidas? Há sempre dúvidas. Duvidas? Não sabes que Rachi prendia as tranças ao tecto num espernear frenético ondulando espirais de um mundo labiríntico, quadrado. Percurso aguado por tintas de aguarela que descrevem no seu suave discorrer a vidência nacional do Alentejo de luz em ziguezague calcorreando por uma matéria informe ao bom estilo do pastoso pai de família. Coça o rabo, raspa a franja, esfrega as mãos – esta eu detesto – puxa para cima as calças amarelas, diz que não bebe, nem olha para as pessoas e o resto já não me lembro. Nós vemo-lo ali, como um livro sentado à mesa, com vergonha de ter comido demais. As ostras estavam podres, o vinho estava azedo, a fruta bolorenta...
Miscelânea de cores fétidas. Assim soava a nota musical que Dom Herrero gania ou trovava – como lhe queiram chamar –, certo é que a certa altura a flor murchava no casaco do ministro do governo de Salazar.
(Essa cena da coerência está-me aqui a moer a pipa agora). Voltando ao velho. Os braços já lhe pesavam, então quando queria frisar uma ideia mexia muito as sobrancelhas e anunciou o seu desafio: equilibrar uma estrela cadente na ponta do nariz, subindo um arco-íris.
– Quem o conseguir, ficará com o ouro.
– Ou então ficará com um valente Medo do bigode encharcado em vinho previamente quitado em água-de-colónia trinada de incertezas e desambiguações totalmente irrelevantes. Talvez um pouco menos que correr à neve. O ar ali à volta cheira a bola de Berlim.
Há Burdas espalhadas pelo chão, rasgadas em silêncio. Rachi pegou nos netos, coçou a orelha e pediu-lhes que arrumassem as coisas. Disse estas últimas palavras com brandura, soprando-as do seu buraco.
Chegara o dia feito da noite. O feto a seguir à noite cristalizado numa alucinação bestial, dançando em círculos, falando com os pássaros numa cacofonia muda. Vi então uma cara, anunciava algo que pôs toda a gente a dormir.

B, F, T, V.

segunda-feira, 24 de março de 2008

Longos períodos de ausência

Espero a frase
Que ela se forme
E me diga a mim que a digo
O que quero afinal eu dizer

Que ela se pense
Como se eu outro fosse
E para mim olhasse
Sem me-o ver

Não me vejo nem ao outro que vejo ser
Que agora vejo escrever
De quem são estas mãos?

Hoje a palavra é estaca

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quinta-feira, 13 de março de 2008

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A gordura das pessoas é dos planetas.








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vinho inaugural

E o vinho cavalo rasgou a folha inaugural, fez a vírgula e saiu do carro em direcção à festa, daí os caracóis. Ia tão cansado... Mas estavam ali mais quatro pessoas. Não se encontrava só e ouvia-lhes os estômagos da Santa Adega, se a Marta estiver cooperativa e o vinho cavalo. O caniche anglo-italiano observa a mesa de bilhar e diz: – Se a bandeira estiver vermelha, então comerei o escaravelho dourado, o mais fino.
É um sintoma dos cadáveres. Um homem raspa, raspa, raspa até lhe falharem as canetas. Ladrões, pilhas de desenhos, cartas por abrir, o fumo das paredes, fanadas. É assim que se sente em casa, parece-nos.
O público levantou-se e aplaudiu algo desinteressado. De seguida, alguém acendeu as luzes e as pessoas começaram a abandonar a cave. Nas escadas, lembro-me que paraste para acender um cigarro e javardaste o bar da nave porque a adega já não estava cooperativa e a Marta já não era Santa, junte-se isto ao facto que o homem que anteriormente se jogara ao mar e temos de ficar tenros como carcaças, encher os pulmões e dar uns tirinhos ao príncipe. Está quase, amanhã vamos enterrá-lo em giz até ao pescoço, em sintonia com os costumes de então. Você, ou vossa mercê, poderá, pois, acompanhar esses sujeitos num passeio pela serra das Cóias, Barreirh e Gaspa. Perto do poste do limbo telefónico, detivemo-nos em algo que insistentemente alastrava do aparelho, até ao sótão da vizinha destrambelhada que voava em noites de maré alta, até que o sol a viesse brindar aos ouvidos, com a sua doce música.
Rodou o botão, dando-lhe um toque mínimo com o polegar, já cansado de assinar folhas de ponto, e prontamente se passaram a ouvir duas melodias, nítidas, uma de cada lado do campo em quantidades inferiores à centena. Os mongóis, por sua vez, não se podem dar a esses luxos. Eles tomam banho no rio e vivem, quase sempre, em relotes e atrelados. Frequentemente, as cenas de pancadaria, o sexo, a chuva ácida ou talvez as férias da Páscoa com a bela de uma banda sonora a acompanhar todo este magnífico festival selvático e perigoso, mas uma delícia.
Encham mais um copo, despejem essa bexiga. Meus amigos, sejam felizes como tigres, a cercar o cavalo, sem medo de cada trago, sem pressa de o acabar.

B, F, V.